quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Bailarina do asfalto


Ponta dos pés sobre o cinza
Passas calma
Calma lenga
Entrelaçando a brisa doce
Dessa tempestade

Um, dois, três
Plié sobre a terra degolada
Bailarina de vocação natural
Para as coisas mórbidas
Passas pelo cenário sujo
À meia luz de pescoços curvos
Dos cisnes que cospem fogo

Bailarina de rua
Passos delicados
Prepara-se para último ato
Salto de penas
No lago rubro dos cisnes mortos
Ultimato.
Eu quero, juro que quero repousar com você numa vontade, numa casinha, à sombra de um jatobá, mas a linha descarrilha, essa curva cigana leva, a saltos do tempo, tenho saudades, saudade é quase mortal, a semana, ao longo das semanas, tudo cessa, já não há tanto, já não é pra tanto, e começam os desejos e começam os corpos sobre corpos, sem seja a guerra nem que venha o amor, é desejo de distrair angústias, de esvair solidões e esquecer de você, que uma noite foi algo de dor. O desejo de, o desejo de vida, saciado pela própria vida que urge pelos dias. E você vai se tornando uma memória, aquela que disse: "toda memória se desmancha em pó de estrada".

mãos cruzadas sobre o login

Era o orgulho. A família aplaudia o contrato assinado. Agora, a vaga ocupava os velhos vazios, e o sonho de mudança já não era necessário. Agora, se enquadrava. Tinha todos os direitos assegurados. O lugar para morar e se proteger da chuva, no qual jamais habitaria. Podia reparar a saúde, aquela que lhe haviam quitado. Pagar pelo estudo, embora o pensamento lhe fosse negado. Almoçava deliciosas comidas, cuspidas pelos outros contratados. O passe pelo ônibus estava liberado, até iria e viria, se as ruas não fossem de cancelas naquele horário. O melhor era esperar um pouco e consumir, depois de tantas horas, uma happy hour. Ou mais uns dias, e o fim de semana. Ou mais um ano, e as férias. Ou mais uma vida para a aposentadoria, quando o desocupado já lhe fosse insuportável. Em troca do troco, dizia sim, sim, sim. Era um profissional. Foi contratado, pois professava a fé em um ofício. Embora a fé, vendida; o ofício, condicionado; a opinião, calada, cavassem, oito horas por dia, apenas o seu calvário. No andar daquele edifício, chamavam isso de trabalho.